As regras para o consumo legal de maconha no Uruguai e o que o Brasil pode aprender com o país vizinho

maconha no uruguai

O Uruguai tornou-se o primeiro país do planeta a legalizar por completo a maconha.

Nosso vizinho do sul, que já mantinha uma política de descriminalização da planta, agora terá controle sobre sua produção e distribuição.

O decreto foi assinado pelo presidente mais querido do momento, José Mujica, no dia 5 de maio deste ano, cinco meses após a aprovação no parlamento.

Mujica que em entrevistas mostrou singela sabedoria:

“Nós visamos o combate ao tráfico de drogas. Não é uma lei de apoio ao vício. É uma maneira de lutar contra a economia do mercado negro”

“Queremos dar um golpe no narcotráfico, tirando dele parte do mercado. Nenhum vício é bom, o único que sugiro aos jovens é o amor”

“Se não existisse (o direito à experimentação), estaríamos condenados para sempre à paralisia: nada jamais mudaria. Não existe outra forma de avançar. A vida institucional de uma sociedade é um experimento permanente”

pepe mujica fala sobre a maconha no uruguai
Foto: Pablo Castro

É exatamente isso que uma sociedade precisa para crescer humana, coletiva e intelectualmente: não ter medo do novo.

O Brasil mesmo com marchas da legalização anuais é uma sociedade bem diferente da uruguaia, mais conservadora e menos propícia a alternativas.

O debate por aqui ainda vai longe. Convenhamos, nada acontece de forma rápida no Brasil. Nada além da construção de estádios para a Copa.

O Uruguai, de certa forma, irá servir como laboratório para o Brasil. Em alguns anos teremos o resultado e saberemos se o tráfico foi erradicado ou se a sociedade foi destruída, como muitos pensam.

A estimativa é que o governo diminua o tráfico em 25% já no primeiro ano. Para isso adotou algumas regras em sua legislação. Dentre elas:

  • O governo distribuirá nas farmácias uma variedade de 5 tipos da planta;
  • As farmácias que comercializarão não poderão expôr maconha nas vitrines;
  • O preço máximo da grama será de 1 dólar;
  • Cada uruguaio poderá comprar até 40 gramas mensais ou 10 gramas semanais;
  • Os consumidores deverão ser registrados com identidade e comprovar residência. Este registro dará o direito de compra nas farmácias;
  • O cultivo é permitido, mas é preciso ser maior de idade e uruguaio – ou estrangeiro com residência comprovada;
  • O máximo permitido, por pessoa, para o cultivo será 6 plantas e a produção não pode passar de 480 gramas anuais;
  • As pessoas que estiverem cultivando em casa não poderão comprar maconha nas farmácias. É um ou outro;
  • A concentração máxima permitida de TCH será de 15%;
  • Proibido fumar e dirigir. Caso necessário, um exame na língua irá detectar se o motorista consumiu maconha;
  • Proibido também consumir maconha em locais de trabalho, estabelecimentos fechados, meios de transporte e instituições de ensino e saúde;
  • Permitida a criação de clubes cannábicos. Cada clube poderá ter entre 15 e 45 sócios e um total de até 99 plantas.

Além de uso recreativo, é comprovado cientificamente a eficácia dos princípios ativos da maconha no combate a doenças.

Aqui mesmo no La Parola, já foi publicado o drama de uma mãe que estava tendo que traficar um medicamento derivado da planta para realizar o tratamento adequado para sua filha de cinco anos. Problema que, felizmente, já foi contornado.

Apesar de o Uruguai ser o primeiro país a legalizar por completo o consumo e o comércio da maconha, algumas outras nações também possuem leis brandas a respeito. 10 exemplos:

Holanda: Pode ser comprada em locais específicos para uso recreativo
Estados Unidos: Liberada para uso recreativo nos estados de Washington e Colorado e para fins medicinais em outros 20 estados
Coreia do Norte: Totalmente permitida. Não é considerada uma droga pelo governo
Espanha: Permitido o cultivo caseiro em propriedade privada
Canadá: Permitida para fins medicinais
Israel: Permitida para fins medicinais
República Tcheca: Permitida para fins medicinais
Romênia: Permitida para fins medicinais
Líbano: Permitida para fins medicinais
Colômbia: Permitida para fins medicinais

Informe-se. Ao contrário do que pensa o “senso comum”, maconheiro não é sinônimo de bandido.

Deixo abaixo algumas dicas de filmes que tratam sobre o assunto. Para um bom debate, é sempre recomendado que o tema seja estudado e que os pontos positivos e negativos sejam compreendidos.

Fiquem tranquilos, conhecimento não é crime no Brasil e faz bem a todos.

Antes de finalizar, vamos à uma pequena história:

Já ouviu falar de Rosa Parks? Rosa foi uma afro-americana que começou a escrever o seu capítulo na história no dia 1º de dezembro de 1955 nô ônibus Cleveland Avenue, em Montgomery, Alabama. Montgomery estava entre as cidades mais racistas dos Estados Unidos. Naquela época os ônibus deveriam, por lei, deixar reservadas as quatro primeiras fileiras aos brancos, tal como hoje é para gestantes, idosos e portadores de deficiências. Os negros deveriam se amontoar no final do ônibus e levantar caso algum branco desejasse sentar nos assentos demarcados. Porém, neste dia 1º, Rosa Parks não levantou. Como consequência foi retirada do ônibus pela polícia e presa.

Indignada, a comunidade negra realizou um boicote aos ônibus de Montgomery que durou até 20 de dezembro de 1956. Os negros organizavam-se para ir ao trabalho a pé, de carona ou de táxi. Chegaram a fazer um acordo com motoristas negros para que pagassem o mesmo valor da tarifa de ônibus na corrida do táxi.

Este boicote só chegou ao fim quando a Suprema Corte dos Estados Unidos declarou que a segregação racial nos ônibus em todas as cidades norte-americanas era inconstitucional. Anos mais tarde, em 1964, foi decretada a lei dos direitos civis, graças ao esforço da comunidade negra, liderada por Martin Luther King Jr., garantindo que negros e brancos tivessem os mesmos direitos.

Agora imagine que o álcool é branco e que a maconha é negra. É tudo uma questão de ponto de vista e de hábitos enraizados em uma sociedade.

Legalização / Proibição
Regulamentação / Proibição
Legalização / Proibição
Regulamentação / Proibição

Devemos desejar sucesso à nova era uruguaia e que os objetivos do presidente José Mujica e de todos os simpatizantes sejam alcançados.

Não existe sociedade que queira viver à mercê do narcotráfico. É comprovado que a ilegalidade das drogas faz com que a população carcerária aumente homericamente, que as crianças troquem as escolas primárias pelas escolas do crime, que os chefes do tráfico sejam capazes de controlar (do sofá, da boca de fumo ou da prisão) toda uma cidade e que o produto seja mais prejudicial ao ser humano pelas misturas que recebe do que pelos seus malefícios naturais.

A guerra às drogas é uma guerra que já está perdida há anos. O Uruguai acaba de adotar uma estratégia ousada, mas não se pode torcer para que ela fracasse.

Afinal de contas, a quem interessa o mal de um povo? Se cuidem com aquelas pessoas que se dizem “cidadãos de bem”, mas que torcem para que algumas mudanças fracassem.

Há algum bem em desejar o ruína do outro? Paz a todos!

PS: Recomendo a leitura do artigo publicado anteriormente no La Parola: Então vamos falar de maconha.