Como a internet está mudando o jeito de cozinharmos?

A cena é clássica. Reunidos antes de um almoço de comemoração ou até mesmo um churrasco estão amigos, familiares, pessoas da faculdade, do trabalho. No Facebook, o evento do grande dia, comentando sobre os preços, bebidas, carnes e pedindo a confirmação dos amigos. Na organização: a grande dúvida da quantidade de mantimentos necessários para comprar.

A primeira a ser consultada não é nem a avó experiente na cozinha ou um amigo churrasqueiro. É a internet. E pode botar as mãos no fogo quem nunca usou o Google para pesquisar como se prepara aquela receita mais elaborada ou até mesmo tirar a dúvida de quantos minutos deixar aquele macarrão instantâneo no fogo.

De todos os cantos em que a internet podia estar invadindo, é na cozinha que ela conquista um espaço cada vez mais soberano. Atualmente, é quase como se não conseguíssemos cozinhar sem a ajuda de um bom blog ou vídeo tutorial. Mas como isso tem afetado nossa relação com a cozinha? E com nossa própria alimentação?

Efeitos

O primeiro efeito a se pensar dessa digitalização da culinária é justamente a grande dependência causada pelos meios virtuais. Ou seja, é quase como se, sem a internet, fosse impossível cozinhar um prato básico. Para isso, é importante que todas as receitas acabem se tornando parte de um aprendizado, e não se limitem a apenas um manual de instruções.

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Sem essa capacidade de saber dominar os elementos da cozinha, é impossível inventar uma receita original. Principalmente porque a capacidade de improvisação fica restringida pela escassa fonte de conhecimento e uma imensa necessidade de consulta constante.

Se no passado era possível ter uma referência em alguém que cozinha e sabe bem cozinhar, hoje é quase como se os adultos estivessem caminhando na direção de serem crianças cozinheiras, despreparadas e procurando auxílio na tela do computador.

Isso justifica, por exemplo, a ascensão de grandes fenômenos da internet. Usados como forma de humor, mas com um profundo senso de utilidade, os tutoriais de páginas como Wikihow são o exemplo claro da geração atual.

Por lá, é possível encontrar dicas e técnicas para criar qualquer tipo de coisa, desde as mais sofisticadas como fazer a manutenção de um computador ou dirigir, até as mais simples, como descongelar um alimento ou pregar um quadro na parede.

É sintomático que existam e que sejam necessários tutoriais virtuais para tarefas que deveriam ser quase requisitos básicos – ao mesmo tempo em que a escola se especializa cada vez mais e fica mais distante das necessidades do dia a dia de um adulto. No Wikihow, é possível até mesmo encontrar dicas de como paquerar e dar o primeiro beijo.

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Gourmetização versus vida saudável

Há também o vilão da gourmetização, que ameaça com o advento da internet e das fotos de comida no Instagram. Está por trás dele não só a exposição e valorização de certos elementos individuais, mas também um aumento do valor agregado a certos elementos e também uma certa padronização das ações. É como se o adjetivo “gourmet” se estabelecesse como um padrão a ser seguido e que acaba por definir as ações em diversas circunstâncias.

Por outro lado, a internet acaba também por ajudar a disseminar e possibilitar um espaço para conhecer dietas alternativas e uma vida mais sadia. Por meio dela, é possível também compartilhar e ter acesso a novidades e boas ideias para melhorar a rotina e modificar completamente as receitas, tornando-as mais saudáveis.

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A arte de cozinhar

Os programas de grande sucesso de audiência recente, como a franquia televisiva internacional Masterchef, que é exibida no Brasil pela Rede Bandeirantes, provam que o apelo da culinária está cada vez mais forte.

Principalmente com a possibilidade de conhecer mais receitas e técnicas que se democratizam por meio da internet. O enorme sucesso do Masterchef prova isso, já que a liderança na audiência e a reverberação virtual são sinônimos dessa aceitação e interesse. Ou seja, o apelo por uma dieta diferenciada, pela busca de novos ingredientes e elaboração de bons pratos já é presente.

Quando ligamos a televisão ou acessamos a internet para encontrar os passos de uma receita, vemos o quanto pode ser simples e isto faz com que mais pessoas se arrisquem a ir para a cozinha e se apaixonem por isto.

Algumas universidades do Brasil já registram crescimento de 45% em um período de 4 anos na procura por cursos de gastronomia. Profissionalizando-se ou não, a verdade é que mais pessoas procuram sair do arroz-feijão e começam a equipar suas cozinhas com fornos elétricos, cooktops (como estes), panelas sofisticadas e utensílios que saem do tradicional, encontrados nas gavetas das avós. A ideia é fazer bonito, tanto com a escolha do prato e a execução da receita, como na hora de servir com muito estilo e sofisticação.

É importante usar a internet como aliada, percebendo suas limitações, questões e benefícios. Cozinhar é também saber improvisar, o que se torna impossível no caso de alguém que só usa a internet ou faz tudo baseado nela. Ela acaba por alimentar a ignorância ao invés do aprendizado.

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Tablet ou receita da avó?

Ter de escolher entre os dois já é um retrocesso. É preciso entender que ambos apresentam vantagens que não podem ser ignoradas. Ter um bom tablet na cozinha é uma realidade que já afeta até mesmo a mais caricata das vovozinhas.

Elas já estão conectadas e desfrutando ao máximo as receitas virtuais. Entretanto, ainda têm muito a ensinar e perceber que essa sabedoria antiga, contida nas pequenas coisas, ainda é muito útil e precisa ser preservada.

A internet pode te ajudar a ser um adulto mais completo, multimídia, multitarefas, mas é preciso que haja independência da web. Que ela seja apenas uma ferramenta e não defina todas as suas experiências ao cozinhar.