Inebriado e Pensante

A tristeza me recobre E mando a cerveja goela abaixo Peço uma bebida forte Rápido Para adquirir a garra e o amor de Continuar!

 

A tristeza me recobre
E mando a cerveja goela abaixo
Peço uma bebida forte
Rápido
Para adquirir a garra e o amor de
Continuar!
(Charles Bukowski)

A programação da 11ª Festa Literária Internacional de Paraty foi divulgada no último dia 23 de maio. Engraçado este nome “festa literária”. Para muitos brasileiros são duas palavras opostas. Mas deixe eu discordar. A literatura também é festa. Diferente, claro, de uma tradicional balada regada à vodka com energético, água de coco e carros amarelos (ao menos em um frívolo sonho, uma vez que quatro quintos do total dessa balada, em métrica global, não possui tamanho recurso na conta bancária para a aquisição de um, e mesmo assim insistem em transparecer que sim).

Divagação parte I

Faltam festas literárias no Brasil. Festas, não feiras. Uma festa literária é algo a mais do que uma feira do livro, que é legal, sempre repleta de lançamentos de obras e promoções, mas que não é uma festa propriamente dita, não é uma celebração. É uma promoção da literatura de forma modesta.

Uma festa literária tem gente foda, gente alegre, gente que interage, gente que…festeja, como a Jornada de Literatura de Passo Fundo em 2009, que acabou com um genial show do Tom Zé e que teve, durante as noites, programações boêmias, para que os participantes pudessem discutir a literatura – e a vida – inebriadamente.

Veja, um poeta inspirado em coca-cola, que poesia mais estranha ele iria expressar? (Raul Seixas – Movido a álcool)

Bebedor e pensante. Raul Seixas aprova a tese.
Bebedor e pensante. Raul Seixas aprova a tese.

O Brasil precisa de mais festas literárias. Só uma festa assim – acrescento também as necessárias mesas de bar, happy hours ou similares – são capazes de proporcionar a sensação de curtir e pensar a vida. Porque a vida só curtida é sem sentido, sem propósito. E a vida só pensada ou discutida é chata, maçante, tipo aula de ensino religioso no segundo grau.

Em agosto deste ano acontece a 15ª Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo. La Parola fará uma cobertura esperta do evento.

Desculpem, caso você leitor se sinta ofendido, mas não é minha intenção. Eu sou a favor das festas, literárias ou não. Caso contrário não estaria filosofando neste momento com uma brilhante, gorda e recheada taça de vinho. Gostaria de dizer também aos meus amigos que possuem pouco apreço pela leitura que reconheço o quão Sócrates vocês se tornam quando dividem uma garrafa de cerveja comigo.

O real objetivo deste texto (que, obviamente, não é mais) era falar sobre a Flip, que este ano homenageará Graciliano Ramos, escritor modernista do famoso romance Vidas Secas, uma obra que você pelo menos já deve ter ouvido falar. Então, tudo o que você precisa saber sobre a Flip você encontra em flip.org.br.

Divagação parte II

Graciliano Ramos faz parte daquele time de autores brasileiros clássicos que as escolas ensinam o adolescente a desgostar. O livro começa assim:

Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros apareceu longe, através dos galhos pelados da catinga rala.

As minhas perguntas, na época de escola eram: “O que diabos eu tenho a ver com isso? Qual a verossimilhança disso com a minha vida hoje?”. Felizmente conheci pessoas que me apresentaram Bukowski e Jack Kerouac, dois escritores que fizeram eu gostar da leitura em uma época de transição da literatura infanto-juvenil para um conteúdo mais adulto, mais cabeçudo. Meses depois li Álvares de Azevedo, Lima Barreto, Machado de Assis e Aluísio Azevedo (em ordem), excepcionais escritores brasileiros, mas que não faziam sentido para mim quando eu estava com 16 anos. Eu precisava de um pouco mais de maturidade para assimilar a literatura clássica, maturidade essa que a escola não me ensinou. Se não fosse o PH ter me emprestado o “Numa Fria” do Bukowski eu acho que nunca teria aprendido a absorver literatura.

Charles Bukowski também aprova
Charles Bukowski também aprova

O genial da escrita é que uma mera notícia pode se tornar em um ensaio com divagações aleatórias. Eu diria que se você chegou até aqui você merece um brinde. Enfim, sem mais delongas, segue abaixo a programação da Flip, evento que terá a presença de Gilberto Gil, Daniel Galera, Eduardo Coutinho e outros feras.

Dia 3/7, Quarta

19h | con­fe­rên­cia de aber­tura Graciliano Ramos: aspe­reza do mundo e con­ci­são da lin­gua­gem
Milton Hatoum

21h30 | show de aber­tura
Gilberto Gil

Dia 4/7,  Quinta

10h | mesa 1 – O dia a dia debaixo d’água

Alice Sant’Anna
Ana Martins Marques
Bruna Beber

12h | mesa 2 – As medi­das da his­tó­ria

Paul Goldberger
Eduardo Souto de Moura

14h30 | mesa Zé Kléber – Culturas locais e glo­bais

Marina de Mello e Souza
Gilberto Gil

17h15 | mesa 3 – Formas da der­rota

José Luiz Passos
Paulo Scott

19h30 | mesa 4 – Olhando de novo para Guernica, de Picasso

T. J. Clark

Dia 5/7, Sexta

10h | mesa 5 – Graciliano Ramos: ficha polí­tica

Randal Johnson
Sergio Miceli
Dênis de Moraes

12h | mesa 6 – O pra­zer do texto

Lila Azam Zanganeh
Francisco Bosco

15h | mesa 7 – A vida moderna em Kafka e Baudelaire

Roberto Calasso
Jeanne Marie Gagnebin

17h15 | mesa 8 – Ficção e con­fis­são

Tobias Wolff
Karl Ove Knausgård

19h30 | mesa 9 – Lendo Pessoa à beira-mar

Maria Bethânia
Cleonice Berardinelli

21h30 | mesa 10 – Uma vida no cinema

Nelson Pereira dos Santos
Miúcha

Dia 6/7, Sábado

10h | mesa 11 – Maus hábi­tos

Nicolas Behr
Zuca Sardan

12h | mesa 12 – Encontro com Eduardo Coutinho

15h | mesa 13 – O espe­lho da his­tó­ria

Aleksandar Hemon
Laurent Binet

17h15 | mesa 14 – Os limi­tes da prosa

John Banville
Lydia Davis

19h30 | mesa 15 – Encontro com Michel Houellebecq

Dia 7/7, Domingo

11h | mesa 16 – Graciliano Ramos: polí­ti­cas da escrita

Wander Melo Miranda
Lourival Holanda
Erwin Torralbo Gimenez

13h | mesa 17 – Tragédias no micros­có­pio

Daniel Galera
Jérôme Ferrari

15h | mesa 18 – Literatura e revo­lu­ção

Tamim Al-Barghouti
Mamede Mustafa Jarouche

17h | mesa 19 – A arte do ensaio

Geoff Dyer
John Jeremiah Sullivan

18h45 | mesa 20 – Livro de cabeceira

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