Na década de 70, O Pasquim quase teve um destino parecido com o Charlie Hebdo

No dia 7 de janeiro de 2014, três homens encapuzados invadiram o escritório do semanário francês Charlie Hebdo e assassinaram 12 pessoas, incluindo o diretor da publicação e outros três cartunistas. Tudo isso aconteceu em virtude das constantes sátiras, uma marca do semanário, que o Charlie Hebdo faz com as religiões. No plural.

Acontece que radicais seguidores de Maomé levaram para o lado mais extremo possível. A intolerância é um dos maiores atrasos que o ser humano pode possuir. Nesse caso, a intolerância foi religiosa, mas existem outras vertentes dessa característica ridícula espalhados em episódios na história.

Tentando fazer um comparativo com o Brasil, a publicação que mais se familiarizaria com o Charlie Hebdo é o genial O Pasquim, fundado no final da década de 1960 por Tarso de Castro, Jaguar e Sérgio Cabral.

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Independência ou Morte? Mocotó! | Arte: Jaguar

Em pleno regime militar, fazer O Pasquim era considerado um ato de coragem, loucura e suicídio. Não necessariamente nessa ordem. O jornal mais ácido e incisivo que a imprensa brasileira já conheceu não existe mais, mas poderia ter existido menos ainda, como conta José Amaral Argolo, no livro “Terrorismo e Mídia”:

O coronel de Artilharia Alberto Carlos Costa Fortunato, acatado como dos mais ativos integrantes do chamado Grupo Secreto, responsável por dezenas de atentados entre 1968 e 1970, disse ao autor (durante entrevistas realizadas no Rio de Janeiro e em Brasília) que um dos cuidados na etapa de planejamento era checar os alvos de modo a evitar a morte de pessoas inocentes.

Ele explicou que em uma só dessas tantas operações poderia ter acontecido uma tragédia. Foi na madrugada de 12 de março de 1970, quando ele próprio e mais dois participantes do Grupo: o marceneiro Hilário José Corales e um agente do Centro de Inteligência do Exército identificado apenas como Niase, jogaram uma bomba nos escritórios do semanário O Pasquim, na Rua Saint Roman (Posto 5, Copacabana).

Sem que os perpetradores soubessem, os editores daquele jornal participavam de uma reunião de trabalho que se estendeu para além da hora de costume. Felizmente o petardo (algumas bananas de dinamite acondicionadas em uma lata grande e redonda de banha, produto de cozinha muito utilizado na época) não detonou.

Intolerância religiosa, política, sexual, cultural, racial, tecnológica, étnica, ideológica ou o que for é caso grave. O cérebro do ser humano não foi feito para ser estagnado. A intolerância só possui uma função: ser intolerante com ela mesma.