O Destino de Júpiter: é tempo de cessar comparações com Matrix

Os irmãos Andy e Lana Wachowski certamente revolucionaram o cinema contemporâneo quando conceberam o mundo de Matrix. A trilogia, apesar de dividir opiniões sobre como encerrou sua saga, não apenas redefiniu conceitos técnicos cinematográficos, como também alavancou todo um movimento em favor do cinema de qualidade e criatividade nas ficções científicas onde pouco se arriscava na época.

Ainda assim, Andy e Lana seguem prezando por trabalhos autorais, e se já não mais com o mesmo ímpeto quase impossível de comparar com o sucesso estrelado por Keanu Reeves e o seu Neo-salvador, O Destino de Júpiter chegou aos cinemas para exibir novas estruturas e reflexões à altura dos irmãos.

Inicialmente, O Destino de Júpiter chegaria aos cinemas em julho de 2014, mas sem nenhum motivo aparente o longa acabou estreando somente em fevereiro deste ano. Na trama, uma jovem mulher (Mila Kunis) descobre ter uma assinatura genética especial, fato que a torna uma ameaça para um universo no qual ninguém fazia ideia que existia. O elenco ainda conta com Channing Tatum, Sean Bean e o nome da vez para o Oscar 2015, Eddie Redmayne.

A princípio, O Destino de Júpiter seria nada mais que um filme repleto de efeitos visuais grandiosos e movimentos acrobáticos nas cenas de ação, mas o projeto que custou US$ 176 milhões apresenta, mesmo que timidamente, fatores além disso. Muitos críticos e boa parte do público não conseguem digerir o cinema dos irmãos Wachowski. Existe sempre uma inevitável comparação e pressão para os irmãos realizarem algo nos mesmos moldes de Matrix. Todavia, vivemos em um tempo completamente diferente. Quando o primeiro Matrix chegou aos cinemas no ano 1999, a internet ainda era uma barreira que engatinhava, e prender alguém na poltrona de uma sala de cinema talvez fosse algo mais prático, pois aliar tecnologia e conteúdo era novidade. Poucos sabiam fazê-lo. De lá pra cá, smartphones tomaram conta das salas e os aguardados trailers antes da exibição principal tornaram-se artigo de luxo. A competição com o alcance das mãos e a representação visual tornou-se uma batalha árdua, e ainda que O Destino de Júpiter não trate disso, como ele é visto pode e deve se tratar disso. Isso acontece porque há breves, mas interessantes questionamentos ao longo dos 127 minutos da produção que acabam brotando numa espécie de easter eggs a cada cena exagerada de ação e nas inúmeras explosões e perseguições ao longo da produção.

Mesmo com certos momentos entediantes, o filme consegue suprir os desejos dos irmãos em ir contra o mundo pop e dos blockbusters presentes nos dias atuais. De certa forma, existe toda uma conjuntura na filmografia dos irmãos que gira entorno de valores perceptíveis e também imaginativos – até mesmo em Speed Racer (2008) e no complexo A Viagem (2012), percebe-se o zelo para inventar e ousar até mesmo naquilo que já existe.

Talvez tanta liberdade seja fruto dos bilhões lucrados pela parceria dos irmãos com a Warner Bros e a trilogia Matrix. Contudo, os mesmos irmãos que já escreveram quadrinhos e começaram suas carreiras como roteiristas no filme Assassinos (1995), pérola estrelada por Sylvester Stallone e Antonio Banderas, ainda devem suprir por um bom tempo o lado renegado do cinema – o lado no qual não necessariamente cabem julgamentos simplórios sobre o produtor ser ou não sucesso, mas sim se ele deve ou não atingir o status da coragem de ao menos tentar proporcionar expectativas legítimas e reflexivas. Ficção e realidade continuam de mãos dadas. Não é mais Matrix, e nem deveria ser.