O Elo Perdido

Existe um buraco negro na obra de Raul Seixas. Entre Raulzito e Os Panteras — seu primeiro álbum, lançado em 1968 — e Krig-Há, Bandolo! (1973), o roqueiro trabalhou como produtor da CBS (a gravadora Columbia, que hoje pertence a Sony Music). Nesse período, além de compor para incontáveis bandas e artistas (como Jerry Adriani, Renato & Seus Blue Caps, Fábio, Wanderleia, Leno, entre muitos outros), Raul ainda comandava as sessões de gravação. Definia como deviam ser os arranjos, ajudava na escolha de timbres e sonoridades, além de algumas vezes até mesmo participar dos registros, tocando ou fazendo backing vocals.

 

Dessa fase, se destacam o disco conceitual Sociedade da Grã-Ordem Kavernista apresenta Sessão das Dez (1972) — gravado em conjunto por Raul, Sérgio Sampaio, Edy Star e Miriam Batucada —, o clássico Eu quero botar meu bloco na rua de Sérgio Sampaio e Vida e Obra de Johnny McCartney (1971) de Leno (esse último permaneceu “perdido” por décadas). Entretanto, ainda existem mais de 80 composições praticamente inéditas de Raul Seixas, gravadas por incontáveis nomes da música brasileira.

Da esquerda para direita - Sérginho, Luis Wagner, Leno, Raul Seixas e Walmer, na época em que Raul produziu o álbum Vida e Obra de Johnny McCartney
Da esquerda para direita – Sérginho, Luis Wagner, Leno, Raul Seixas e Walmer, na época em que Raul produziu o álbum Vida e Obra de Johnny McCartney

Em 1995, o jornalista cultural Marcelo Froes — que também é proprietário do selo Discobertas — conseguiu reunir, nos arquivos da Sony & BMG, todas as faixas dessa fase do Raulzito produtor. O material foi remasterizado e uma caixa com 5 CDs chegou a ser produzida. Publicações musicais já haviam até divulgado o release e as capas dos discos que integravam a coleção. Porém, às vésperas do lançamento, a gravadora foi ameaçada com um processo judicial devido a questões de direitos autorais. Os 3 mil exemplares do box Deixa eu cantar nunca chegaram às lojas.

Raul teve 3 filhas com 3 mulheres diferentes. Duas herdeiras moram nos Estados Unidos e uma no Brasil. A filha que reside no país é a DJ Vivian Seixas. Através de procuração, ela permite que sua mãe, Kika Seixas — que não foi casada com Raul —, administre o espólio do cantor. Conforme uma série de matérias de autoria de Cristiano Bastos (verdadeiro pesquisador do legado raulseixista), publicadas na revista Rolling Stone, se sabe que Kika embarga praticamente qualquer lançamento relacionado ao artista (ela estaria procedendo conforme orientação do seu mentor e$piritual), desde biografias até material inédito.

De alguma forma, a caixa nunca lançada de Deixa eu cantar acabou vazando na internet. Recentemente, uma série de internautas fez download dos faixas. Entretanto, os links foram denunciados e rapidamente o servidor tirou os arquivos do ar. Mas já era tarde: o material foi replicado e já pode ser garimpado com certa facilidade na rede mundial de computadores.

Raul Seixas (esquerda) produzindo o álbum de Sérgio Sampaio (direita)
Raul Seixas (esquerda) produzindo o álbum de Sérgio Sampaio (direita)

As faixas são de encher os ouvidos de qualquer fã, tanto do Raul quanto dos artistas reunidos. Há músicas como Convite para Ângela, gravada por Leno, cuja melodia foi reaproveitada anos depois em Sapato 36. Uma versão ancestral de Eu sou eu, Nicuri é o Diabo (com guitarras envenenadas) que saiu em um disco de Lena Rios. O blues rock raulzístico O crivo, registrada pelo amigo de infância Waldir ‘Big Ben’ Serrão (fundador do Elvis Rock Club). Uma Se o rádio não toca com versos novos, interpretada por Fábio. Ainda se encontra composições exclusivas gravadas por nomes como Rita Lee & Tutti Frutti, Ira! e Barão Vermelho.

Com 85 composições de um dos roqueiros mais aclamados — e controversos — do país, Deixa eu cantar é o verdadeiro elo perdido na obra discográfica de Raul Seixas. Graças aos caminhos de rato na babilônia da informação que é a internet, esse material foi disponibilizado, ainda que de forma “ilegal”. Os fãs mais hardcores do cara ainda podem sonhar com outras raridades, já anunciadas, mas guardadas a sete chaves (como as demos dessas faixas, com Raul ao violão, e que preencheriam 3 CDs segundo especialistas). Resta esperar que mais material inédito seja liberado, nem que seja por via digital. Por enquanto, já há uma série de novidades — nem tão novas assim —para se esbaldar.

Kavernistas
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