O Submundo do Narcotráfico Mexicano

Em quase todos os setores político-econômicos, o crime organizado está no comando.

As motivações para a ilegalidade são basicamente dinheiro e poder e, infelizmente, a comercialização de drogas é um dos meios mais adotados para se conquistar isso.  

Na atual economia baseada em competições antiéticas, o narcotráfico é o mercado que possui as maiores taxas de rentabilidade e o que gera lucro mais rapidamente, mas também é o que apresenta os maiores riscos.

Os narcotraficantes, encorajados principalmente pelo fracasso das políticas antidrogas, acabam enxergando oportunidades potenciais no mundo da criminalidade.

Orientados pela crueldade, violência e intolerância, cartéis de drogas no mundo inteiro ganham bilhões através de um fluxo interminável de produtos ilícitos. Gangues criminosas estão por toda parte, mas, hoje em dia, em se tratando do narcotráfico, nenhum país é tão desenvolvido quanto o México. E é para lá que vamos.

Uma cultura de luxo e extravagâncias

Na Cidade do México, todos os chefes do narcotráfico têm mansões incrivelmente luxuosas, onde é possível encontrar móveis, artefatos e artigos tão raros que, juntos, valem uma quantia inimaginável de dinheiro.

Bens de luxo são símbolos da cultura do narcotráfico, e por isso a luxúria é um comportamento-padrão entre os líderes de cartéis de drogas. Esses manda-chuvas vivem numa realidade repleta de ostentação e riquezas.

Com orgulho, eles esbanjam sua fortuna para manifestarem poder e status.

Um exemplo desse tipo é Zhenli Ye Gon, ex-empresário do ramo farmacêutico que foi preso nos EUA em 2007, acusado e sentenciado por vender substâncias químicas usadas na fabricação de metanfetaminas para cartéis de drogas mexicanos.

Além de uma mansão, Zhenli mantinha em posse diversos recursos materiais suficientes para causar um mínimo de cobiça alheia. Mas sua desonestidade o arruinou.

Os bens de uma casa dizem muito sobre a personalidade de seus donos. Durante o confisco da mansão de Zhenli Ye Gon, foram encontrados lustres de cristal Baccarat, sofás Versace, relógios Patek Philippe e outras relíquias que valem muita grana. Além disso, foram apreendidos na mansão $205 milhões em dinheiro vivo!

A avaliação das posses de Zhenli serve como exemplo para comprovar que “ter” e “ser” são a mesma coisa para os chefes do narcotráfico.

Líderes de cartéis agem como monarcas arrogantes, mas também são socialmente influentes. Por mais que sejam odiados pelas autoridades que os caçam, não admira o fato de que, geralmente, eles sejam vistos pela sociedade como figuras públicas; verdadeiras celebridades que atraem atenção por inveja ou admiração.

A ineficácia da política antidrogas

A estratégia antidrogas mais adotada até hoje foi a da repressão e, exatamente por causa dessa abordagem explicitamente errada, o narcotráfico impera. Segundo o atual presidente uruguaio, Pepe Mujica:

“Se você quer mudar uma situação, não pode seguir fazendo a mesma coisa, tem que buscar outro caminho.”

É uma inferência óbvia, mas essa lógica não prevalece na política.

No ano 2000, toda a legislação antidrogas foi revista, e os acordos entre governo e traficantes sofreram alterações, mas essas mudanças não foram para melhor. No México, como em todas as nações, a repressão às drogas só piorou as coisas.

Desde 2001, o governo mexicano mobiliza cerca de 40.000 tropas do exército como ativos de defesa na guerra contra o narcotráfico. Atualmente, no país, as pessoas ainda trombam diariamente com soldados munidos de granadas e metralhadoras, a qualquer hora, em qualquer lugar. E detalhe: os soldados usam máscaras que cobrem seus rostos por inteiro, pois eles não querem ser identificados nessa luta, com medo de morrer.

Após essa revisão das leis antidrogas no início do século XXI, praticamente todo o efetivo policial do México foi corrompido pelos cartéis. Em detrimento disso, vários problemas sociais começaram a surgir descontroladamente no país, com a maioria das cidades mexicanas sendo transformadas em zonas de guerra.

George Grayson, especialista em narcotráfico da William And Mary School, diz:

“Hoje, existem 6 ou 7 cartéis que competem entre si, e uma das formas de competição é apostar quem é melhor não só na violência, mas também na violência sádica.”

No entanto, o governo mexicano nem sempre esteve em guerra contra as drogas. Antes disso, o foco político era outro, como Grayson explica:

“Era uma política de viva e deixe viver. Os líderes dos cartéis pagavam quantias generosas às autoridades estaduais e federais para serem esquecidos. Eles não sequestravam civis, e até tinham um certo respeito por essas autoridades.”

Michael Braun, Chefe de Operações da DEA, avalia o retrospecto histórico da criminalidade:

“A única coisa que se conquistou naquele período de 7 décadas (1930-2000) foi o encorajamento e fortalecimento do crime organizado.”

Narcotraficantes são famosos pela crueldade. Eles perseguem e matam a família de policiais ou políticos que vão atrás de seus comparsas.

Os cartéis mexicanos continuam em expansão, o que é preocupante. Na medida em que os narcotraficantes vão adquirindo maior poder e confiança, diminui ainda mais a credibilidade das autoridades, que já têm uma reputação de ineficácia. Mujica não foi irônico quando constatou:

“O narcotráfico está rindo da repressão às drogas.”

Sinaloa

O Estado de Sinaloa é o ponto de origem e também o epicentro do narcotráfico mexicano. À primeira impressão, Sinaloa se assemelha a uma cidadela qualquer. Porém, com olhares mais atenciosos, percebe-se que é um mundo completamente hostil.

Por exemplo: quando um comandante da polícia local sai para engraxar seus sapatos, ele sempre tem quatro homens o rodeando, todos fortemente armados para defendê-lo. Carros oficiais possuem vidros à prova de balas, pois toda segurança é pouca frente às constantes ameaças que recebem diariamente.

Os habitantes de Sinaloa costumam ir ao banco para realizar suas transações monetárias, o que é normal. Contudo, o dinheiro circula muito mais rapidamente pelas ruas, onde estão os palcos das negociações do mercado de drogas da região.

Por toda Sinaloa, a figura de narcotraficantes, sequestradores e assassinos profissionais caminhando pelas ruas é tão comum quanto a de pedestres e vendedores ambulantes. O perigo na região é realmente explícito.

Edgardo Buscaglia, P.h.D da agência Organized Crime Expert, fez sua análise sobre a atual realidade do narcotráfico mexicano, aprofundando-se no caso de Sinaloa:

“Sinaloa está se consolidando, pois eles conseguiram corromper mais e crescer mais. Como consequência, Sinaloa se tornou o principal jogador do México.”

Críticos afirmam que a influência do narcotráfico mexicano no governo é óbvia, como os números apontados por Buscaglia confirmam:

“De 52.000 detenções, menos de 1.000 têm ligação com Sinaloa, e a maioria dessas detenções termina impune, porque o arquivo dessas ocorrências vai pelo ralo.”

O império de El Chapo

Sinaloa é o maior e mais poderoso cartel de drogas de todo o México, representando uma das maiores organizações do hemisfério ocidental, com centros de distribuição de drogas espalhados pelos 6 continentes. O líder desse empreendimento era Joaquín Guzmán Loera, mais conhecido como “El Chapo”. Conta Malcolm Beith, o biógrafo dele:

“As estimativas em 2009, com base nos cálculos militares, políticos e de pesquisadores, foram que El Chapo tinha 500.000 pessoas em seu empreendimento e controlava 60.000 km² de área no México.”

El Chapo ocupou a 701ª posição dos homens mais ricos do mundo, segundo a Forbes. Por algum tempo, ele foi o segundo homem mais procurado do planeta, atrás apenas de Osama Bin Laden, que hoje está morto.

Guzmán foi preso em 1993 e transferido para Puente Grande, uma prisão de segurança máxima. Só que, mesmo preso, ele continuou controlando o cartel de Sinaloa através de um sistema mantido na base da corrupção. Beith explica:

“O modo de operação de El Chapo em Puente Grande era corromper, o mais rápido possível, todos de quem precisava. Ele contratou uma secretária que se aproximava de um guarda, zelador ou faxineiro, lhes oferecendo dinheiro enquanto propunha uma parceria de negócios. Se alguém oferecesse resistência, a secretária tirava um lap-top de sua bolsa e mostrava fotos da família da pessoa. Então, rapidamente a pessoa concordava, pois sabia que sua família seria assassinada se não houvesse um acordo.”

A jornalista Anabel Hernandéz complementa:

“Guzmán tomou conta da prisão. Todos faziam o que ele queria, quando queria. Seus capangas levavam até ele mulheres, drogas, comida, além de litros e litros de álcool.”

Esse negócio deu certo por incríveis oito anos quando, em 2001, Guzmán, prevendo o vazamento de seu sistema corrupto, decidiu fugir daquela prisão. Para isso, ele organizou um plano de fuga, como Beith relata:

“No meio de uma madrugada, El Chapo delegou a um de seus faxineiros a tarefa de levar um carrinho de roupas sujas até sua cela. Então, El Chapo se enfiou dentro do carrinho (já que era baixinho), enquanto o infeliz faxineiro levava seu chefe a uma sala que havia sido mantida destrancada. Todas as câmeras de segurança no entorno foram cortadas, e até hoje ninguém sabe quem as cortou. Tinha que haver cumplicidade entre as autoridades.”

Em seguida, o faxineiro levou El Chapo para o subsolo e o colocou dentro do porta-malas de um carro não identificado, que seguiu sorrateiramente até o interior de Guadalajara, o local do exílio.

Cálculos feitos posteriormente concluem que essa fuga custou aproximadamente $2,5 milhões a Guzmán, que não se arrependeu de seu investimento.

Após a fuga, as autoridades foram atrás de Guzmán novamente, mas este parecia ter desaparecido da face da Terra. Enfim, em fevereiro de 2014, El Chapo foi capturado em uma operação de sucesso organizada pelo atual presidente mexicano, Enrique Peña Nieto.

Uns veem El Chapo como benfeitor; a maioria, como ditador. O fato é que ele foi o responsável pela administração de um dos maiores cartéis de drogas da história.


A guerra contra as drogas é inútil, como o ativista de políticas públicas Ethan Nadelmann explica em sua palestra do TED, abaixo:


Ref. pesquisa: National Geographic / DEA / BBC / El Universal / El Pais