The Endless River: O Feng Shui do Pink Floyd

Sabe aquele momento quando suas mãos tremem? Quando a dúvida se faz presente e você, mesmo temeroso, tenta superá-la? A vida é uma instituição que ensina mais que doutorado de física quântica, ela causa dor, alegria, confusão, tristeza, e outras dezenas de polaridades sentimentais.

A música reflete a vida. O som nosso de cada dia inicia um novo ciclo toda vez que é devidamente iniciado pelo mestre de cerimônias mor das frequências auditivas: o play. A leveza ou peso de uma melodia, a poesia de rara beleza ou palavras ao vento. Cada som tenta ser um nirvana diferente, é uma energia que serva para cada momento, porém poucos são os sons que conseguem atingir e passar o ideal lunático de verdade absoluta para o ouvinte em todas as ocasiões.

Pink Floyd - The Endless River - Gravação (5)Pouquíssimas bandas conseguiram condensar meu estado de espírito, em qualquer humor, moldando o mesmo para que ele fosse perfeitamente encaixado no som. Chamo isso de plenitude sonora, e senti isso poucas vezes em minha vida, são momentos tão raros que gosto de passá-los sozinhos, e é nesta parte do texto que as palavras me deixam na mão, só o abstrato, aquilo que você carrega no peito, que pode explicar os sentimento de quando ouvimos um som que faz conexão com nosso lado emocional-sentimental.

Pink Floyd - The Endless River - Gravação (4)Ouvindo The Endless River até minha orelha virar ao contrário, desde o lançamento do single (o único cantado de todo o disco), o lindíssimo Louder Than Words, consegui mais uma vez conversar comigo mesmo. Todas as vezes que ouvi esse disco não estava em mim, estava fora de mim, mas me sentia perfeito. Parece que esse som, não só com este disco, mas falando sobre tudo que o Floyd já fez (com ou sem Waters), tira todas as mazelas de meu corpo e alma, e enquanto escuto a melodia sou um ser virtuoso, um ser perfeito, simplesmente não me abalo.



A guitarra do senhor David Gilmour não é a mais virtuosa das galáxias, mas o que ele tira de sua Fender é completamente inexplicável, ele opera o timbre da guitarra de uma maneira que parece que… (Nesse exato momento onde a frase ficou inconclusiva apertei play novamente. Minha mão não está pesada enquanto escrevo, aliás ela nunca esteve tão leve, mas é neste momento que sinto a faísca que me faz sentar para escrever, ou que me faz ouvir música. Esse sentimento retumbante e grandioso, que enquanto dura me faz acreditar que tudo é possível… O céu parece até mais azul do que a própria capa deste álbum!)

Pink Floyd - The Endless River - Gravação (3)O Floyd vai terminar depois desse trabalho, mas o que fica é esse encerramento grandioso, e eles não precisavam disso necessariamente, mas até para encerrar um ciclo os britânicos são certinhos e levemente conceituais.

Um trabalho muito bom que mais uma vez mostra esse lado de crescimento pessoal, de experiência. O Floyd navegou e muito nesse tal de The Endless River, mas o fez enquanto pôde. No meio da peleja alguns membros foram ficando pelo caminho, e agora é hora de sair, mas o barco não vai parar, o manche seguirá um rumo eterno, a música fica para a posteridade e a banda encerra um período, mas o continua ao mesmo tempo.

Pink Floyd - The Endless River - Gravação (6)Um paradoxo chamado rock progressivo e camadas e mais camadas de teclado, uma guitarra mais livre do que pensamento, e um valor inestimável. Não é o melhor disco do Pink Floyd, nem de longe, mas é um álbum muito sincero, cada faixa não pode ser imaginada de uma forma melhor do que aqui é tocada, é apenas exato, um campo magnético que nos faz orar pela mesquita da música de verdade, aquela que é sentida dentro de nós mesmos…

Poderia continuar escrevendo sobre esse disco, poderia digitar e digitar até que este aglomere caracteres suficientes para se tornar uma tese filosófica… Mas para que a pressa? A vida é um rio sem fim, uma música que nunca termina, ou um momento que em nossa mente acaba, mas que na essência é contínuo.

Pink Floyd - The Endless River - Gravação (7)A vida não tem botão de pausa, navegue pelo rio e saiba que uma hora você não vai estar capitaneando seu encouraçado, mas seu barco segue remando, nada tem fim, tudo é sempre só o começo, abrindo com Things Left Unsaid e tirando toda e qualquer dúvida dessa caravana sonora com as últimas palavras cantadas na já conhecida Louder Than Words, o último retrato falado em uma discografia que sempre foi dominada pelo absolutismo instrumental.

Um disco de apenas um take, tudo se interliga, na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma… Frase do Lavoisier? Não, sinônimo de Pink Floyd e seus 53 minutos de um paradoxalmente infinito adeus em missão de reconhecimento eterno com 18 divisões, que na verdade são partes de um todo dentro de um som indivisível. Um enigma, um doce e maluco enigma que seguirá brilhando neste eterno presente sideral de Stephen Hawking.

Pink Floyd Endless River (2014) Capa

Track List:

1. Things Left Unsaid
2. It’s What We Do
3. Ebb And Flow
4. Sum
5. Skins
6. Unsung
7. Anisina
8. The Lost Art Of Conversation
9. On Noodle Street
10. ‘Night Light
11. Allons- y (1)
12. Autumn ’68
13. Allons-y (2)
14. Talkin Hawkin’
15. Calling
16. Eyes To Pearls
17. Surfacing
18. Louder Than Words

Line Up:

David Gilmour (guitarra/vocal)
Nick Mason (bateria/percussão)
Richard Wright (teclados/piano)
Durga McBroom (vocal)
Sarah Brown (vocal)
Louise Clare Marshall (vocal)
Guy Pratt (baixo)