Um texto não publicado numa coluna não existente ou sobre ócio não criativo

Sou estudante de jornalismo e quero ser colunista da Folha algum dia. O semestre na Universidade em que estudo chegou ao fim. Estou em uma festa com algumas amigas comemorando o término e a aprovação bem sucedida. Então, suporemos que escrevo no jornal aos sábados e domingos, semanalmente. Hoje é sexta e ainda não enviei o texto para a minha editora. Ela me manda emails sequenciais cobrando o meu trabalho. Mas a inspiração me falta, o que fazer? Escrever o primeiro texto – que não será publicado – da minha coluna – que não existe.

Parecia muito fácil sentar à mesa, abrir o notebook e escrever sobre qualquer coisa. Parecia fácil colocar um título e discorrer sobre ele. Mas aprendemos na escola que o título, de preferência, deve ser o último a ser escolhido. Sempre que inicio por ele já tenho certeza da conclusão: ela não existirá. Ele irá sobrevoar todos os cantos do meu quarto naquele papel branco esperando para um dia ser utilizado. E eu vou escrever algumas centenas de textos até o momento em que aquele assunto chegue sobre mim como míssil, e seja veloz, não me poupe tempo nem espaço.

E é isso. Estou aqui na mesa enquanto as minhas amigas sambam um pouco na sala de estar. É do desespero da entrega que as ideias aparecem. Quando a inspiração chega é bom aproveitá-la, ela é vital, desperdiçar não é aconselhável. Uma semana sem escrever. O porquê disso? Ócio. Em todas as férias que tiro eu percebo o quanto elas são ruins pra mim. A desocupação é uma ocupação que destrói toda a sua capacidade criativa em escrever. Estar atarefada é um passo indispensável para a tomada de inspiração. Vontade não falta, isso não há como negar. Inclusive, o coração se aperta, o estresse começa a chegar e a insatisfação consigo mesma cresce consideravelmente. Não escrever é uma doença passageira que não gosto de sofrer. Prefiro a gripe ao bloqueio literário.

O primeiro texto da minha coluna não possui um tema específico, delimitado e demarcado há duas semanas. Existe vontade. E coragem de dedilhar sobre o teclado o que a minha cabeça anda gritando. Ou vagando. Poderia ser sobre o “fazer nada” que ronda a vida de uma estudante em férias, sem estágio e sem projeto, mas também com uma vontade filha da puta de estudar sobre outras coisas. O tema poderia ser sobre a lista enorme de coisas que quero fazer contrastando com a falta de tempo para todas elas. O resultado disso é a procrastinação. E não é bem por querer. É por não querer, na verdade, escolher apenas uma das atividades. É uma vontade incessante de estudar, ler e escrever ao mesmo tempo. De não sair da tela do Word, mas também não fechar o livro nunca – mesmo que ruim ele precisa ser concluído.

Do ócio criativo eu não conheço muito. Não basta arrumar a escrivaninha, sentar e escrever. Músicas também não me ajudam. Sou uma escritora em caráter de estudo. Quase nada me inspira. Exceto situações reais. Histórias e causos da vida humana. Reflexões do mundo real. Ainda estou em processo de revitalização das ideias. Ainda não me encontro completa. Este não é um dos melhores textos, de longe isso é perceptível. Mas é um belo tapa buraco pra mostrar que nós, escritores, estamos sempre presentes. Quando não escrevemos para o mundo estamos em luta com nossa própria mente, procurando palavras, formulando frases, desvendando assuntos e esperando, não sem esforço, que o famoso insight apareça e nos contemple com um belo texto.

Olhando bem, esse nunca seria o primeiro texto – não publicado – da minha coluna – não existente. Mas é um início para a constância da escrita. Um dia vou estar na Folha procurando algum assunto pra escrever, vai me faltar inspiração e ócio criativo. Então, lembrarei-me dessa situação angustiante que é não conseguir fazer o que ama por alguns dias e escrevei novamente sobre essa sensação de correr e não sair do lugar – querer escrever e não conseguir.