Dentre as várias memórias que tenho em meu HD cerebral uma sempre se destaca das demais. Em um dia comum estava em casa brincando com meus bonecos e ouvi na TV uma das coisas mais interessantes, cientificamente falando. Não me lembro o nome do fulano, mas sei que este cidadão morreu, porém antes de o fazer deixou claro que gostaria de doar seu cérebro para estudos do ramo das ciências.
Quando ouvi a repórter falando isso até parei de brincar. Fiquei imaginando a cena e tentando entender como os cientistas iriam tirar algum tipo de conclusão. Passados mais ou menos dez anos desse dia ainda não tenho a mínima ideia de como isso é feito, mas sei que se o Tom Zé deixasse eu seria um dos primeiros na fila para ver como sua cabeça funciona, e não, não estou querendo matar o gênio, quero apenas saber como sua brilhante mente funciona. “Vira Lata na Via Láctea” é, para variar, um dos discos mais interessantes do ano.
Quando comecei a publicar textos na internet sempre tive um objetivo, ficar satisfeito com meu conteúdo. Escrever requer muito mais do que apenas tempo, ou até mesmo vontade. Aprendi gradualmente a prestar atenção em tudo que ouvia, e foi ai que a MPB ganhou mais destaque nas minhas playlists.
Logo de cara fui apresentado ao Tom Zé, e já faz bastante tempo que tento captar algo de sua música e colocar em minhas linhas. Tom fala pouco e diz muito, diz tanto que já ouvi sua discografia uma par de vezes e sigo sempre repetindo os discos pois faltam detalhes a serem pescados.
Tom pode ser direto, possui classe para fazer rodeios, fala por metáfora e usa um palavrão tal qual um lord inglês. Ele domina a língua, e em sua mão as palavras dobram, torcem, viram do avesso. Ele tem pleno controle e seu discurso sai exatamente do jeito que ele bem entende.
E disco após disco ele segue manipulando seu discurso de uma forma impressionante, com rimas que a princípio surgem relaxadamente estabanadas, mas que com a conexão de apenas uma palavra já torna uma estrofe genial. E neste novo trabalho, seu décimo quinto de estúdio, a criatividade se mantém pulsante e sua vontade em se reinventar no alto de seus 78 anos é contagiante.
O disco abre com “Geração Y” e os ET’s dento dos HD’s, passa por “A Quantas Você Anda” e uma das três participações da Trupe Chá de Boldo, conversando o novo com o velho, ambos de forma bem freak-fresca e atual. Faz um pit stop no Grajauex do Criolo e mete uma sambeira raiz….Chama O Terno em duas oportunidades, faz o Milton Nascimento bater cartão e ainda segura o Caetano Veloso pra fechar o disco.
O disco é muito cristalino na audição dos arranjos e na qualidade dos mesmos, Tom segue voando baixo e repete a fórmula de um disco recente (e também de sucesso) dentro de sua óbra, falo sobre “Tropicália Lixo Lógico”, lançado em 2011. Tom além de continuar mostrando que é gênio abre espaço para as relevações. Está pra nascer um baiano mais arretado que esse. Som para gratinar o vocabulário, obrigado pela oportunidade, Zé!
Track List:
1. Geração Y
2. A Quantas Você Anda – Trupe Chá de Boldo
3. Banca de Jornal – Kiko Dinucci/Criolo
4. Cabeça de Aluguel – O Terno
5. Pour Elis – Kiko Dinucci/Rodrigo Campos/Milton Nascimento
6. Esquerda, Grana e Direita
7. Mamon – Silva
8. Salva Humanidade – Trupe Chá de Boldo
9. Guga Na Lavagem – Filarmônica de Pasárgada/Tatá Aeroplano
10. Irará Irá Lá – Trupe Chá de Boldo
11. Papa Perdoa Tom Zé – O Terno
12. Retrato Na Praça da Sé – Kiko Dinucci
13. A Boca da Cabeça
14. Pequena Suburbana – Caetano Veloso