O lado rebolativo do instável mestre David Bowie

Essa semana estava pensando muito sobre o cuidado que certos músicos têm com sua obra. É bem comum ouvir dizer que certo indivíduo gravou alguma coisa, mas pelo fato de não ter gostado (ou até mesmo não ter finalizado o trabalho), acabou deixando na conserva, logo, fora do nosso alcance, algo que pode ter dois lados. Momentos que se levados em consideração (agora), podem deixar muitos de nós meio nervosos.

Peguem um clássico por exemplo, imaginem se o Pink Floyd não tivesse gostado do “The Wall” e deixado mofando no estúdio?! É bem provável que ele seria vendido um dia, porém dezenas de anos atrasado… O mundo não seria o mesmo, definitivamente. Temos esse lado de ter certeza que as bandas lançaram os clássicos que podiam, por que justamente vemos os discos em nossas caixas de som, mas imaginem, muitos grupos carregam preciosidades guardadas em cofres na Suíça.

Alguns até assumem isso, mas devido a problemas com os membros originais o conteúdo fica maturando a Jam nas caixas de segurança máxima. Só de pensar já dá até uma dor de cabeça… O único músico que não me deixou aflito com isso foi o Bowie.

David Bowie (2)

David Bowie foi talvez o artista mais puramente artístico que veio à Terra. E o fato do cidadão ter passado por dezenas de estilos diferentes (e ter obtido sucesso), mostra-comprova essa coragem em revelar todo seu exterior em LP, CD e DVD.

Expondo sua música sempre de maneira pessoal e imponente, sem medo, por isso, tenho CERTEZA que David não tem nada escondido, sua arte foi um livro aberto em todos seus registros e acho difícil que exista um disco no padrão “Young Americans” guardado em sua casa por que ele “não gostou” do resultado, aliás só de imaginar a vida sem esse disco já vejo uma humanidade mais pobre, o Soul deste disco é belíssimo.

David Bowie - Young Americans (capa)

Line Up:

David Bowie (guitarra/piano/vocal)
Robin Clark (vocal)
Carlos Alomar (guitarra)
Ava Cherry (vocal)
Mike Garson (piano)
Luther Vandross (vocal)
Larry Washington (percussão)
David Sanborn (saxofone)
Ralph MacDonald (percussão)
Willie Weeks (baixo)
Andy Newmark (bateria)
Pablo Rosario (percussão)
John Lennon (vocal/guitarra/vocal)
Earl Slick (guitarra)
Jean Millington (vocal)
Emir Ksasan (baixo)
Dennis Davis (bateria)
Jean Fineberg (vocal)

Até o momento de lançamento desde disco, Bowie já tinha trabalhado com Folk, Rock Progressivo (e Psicodélico), Hard Rock e Glam Metal, mas o que poucos sabiam é que durante todo esses anos a mente profano do mito nutriu uma grande admiração pelo Funk americano, aquelas Jams repletas de swing, R&B, metais, uma voz mais Soul… Isso era um novo terreno e David precisava estudá-lo antes de mergulhar em mais uma nova sonoridade.

Para tal uma nova banda foi recrutada. E nomes como Luther Vandross e Andy Newmark (Sly And The Family Stone) foram chamados para deixar o clima mais autêntico, trazer a atmosfera perfeita para o Funk, o que de maneira nenhuma atrapalhou os toques excêntricos de David, não, tivemos até John Lennon emprestando seu talento para somar no Groove (!). O Beatle ajudou no último track (Fame) e liberou mais um take para Bowie fazer um cover, dessa vez com “Across The Universe”, faixa onde Lennon toca guitarra e faz o backing vocal.

John Lennon e David Bowie - 1975

E como se esses detalhes não fossem suficientes, quem parou para ver a banda de apoio viu uma lista e tanto, e o resultado disso tudo é de fato fantástico. A sonoridade é exuberante, temos vários detalhes, backing vocals angelicais, percussão, baixão fritando no slap, licks pra lá de ácidos na guitarra… David Sanborn floreando o disco todo com toda a perícia de seu Sax, Mike Garson no piano, feeling é pouco pra isso!

E Bowie registrando seus melhores vocais dentro de um disco. Pra mim nenhum outro trabalho teve o grau de excelência neste ponto, tal que o Funky Bowie deste LP… Deve ser minha paixão pelo Soul falando mais alto, mas é um assunto para se pensar, e ao som de mega hits como a faixa título “Young Americans”, o rebolado Psicodélico de “Fascination” e a fritação guitarrística de “Fame”, podemos chegar a belas conclusões…

Grande disco, uma maravilha para se escutar, e caso o senhor esteja disponível a gastar uma graninha extra, recomendo (e muito) que pegue a versão remaster, pois só nesta modalidade que a excelente “It’s Gonna Be Me”, faixa que não saiu na versão normal, está disponível. Uma pena! Trata-se de uma baladinha absolutamente embriagante, pra fechar o olhos e esquecer da vida, assim como a segunda metade dessa grande gravação.