Gênesis: The Jimi Hendrix Experience no Atlanta Pop Festival

Ouvir Jimi Hendrix sempre foi um acontecimento. Sua guitarra nunca entrou de forma passageira em meus ouvidos e sempre fiz questão de contemplar cada detalhe. Escutar sua lírica na rua, em casa, no telhado, no solo ou na praia, rapaz, sempre foi a mesma coisa.

A sinestesia ficava por conta do cenário, mas o feeling era o mesmo. Acredito que seja algo bastante pessoal, mas ouvir a guitarra do americano sempre foi um momento célebre, um apogeu de emoções que se repete desde que ouvi sua Fender aliciar a organização Stratocaster pela primeira vez.

Foto: Jan Persson / Getty
Foto: Jan Persson / Getty

Eis aqui um homem que nunca estava no palco, pelo menos não só no palco. Quando seu Black Power solava, o corpo celeste ia para outra esfera, conectando-se com tudo e todos como um cidadão do mundo de Woodstock. Uma fonte de energia que não se dissipou, mesmo depois de seu óbito messiânico.

Por isso, quando falar sobre algum mito Hendrixiano, esqueça a síntese. Jimi era uma extensão de tudo que algum dia já teve a capacidade de mudar de forma. Um ato libertário que é maior do que o próprio mito e que dura até hoje justamente por não poder ser minimizado. Um conceito que fica claro quando ouvimos ”Freedom: Atlanta Pop Festival”, um dos picos de todo esse complexo de experiências.

Line Up:
Billy Cox (baixo/vocal)
Jimi Hendrix (guitarra/vocal)
Mitch Mitchell (bateria)

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Track List CD1:
”Fire”
”Lover Man”
”Spanish Castle Magic”
”Red House”
”Room Full Of Mirrors”
”Hear My Train A Coming”
”Message Of Love”

Track List CD2:
”All Along The Watchtower”
”Freedom”
”Foxy Lady”
”Purple Haze”
”Hey Joe”
”Voodoo Child (slight return)”
”Stone Free”
”Star Spangled Banner”
”Straight Ahead”

A apresentação de Jimi no Atlanta Pop Festival é grandiosa. Atinge o mesmo grau de excelência de outros lives consagrados dentro de sua discografia e mostra mais uma faceta de seu feeling extraterrestre, junto com uma conexão sem precedentes frente a sua maior plateia dentro dos Estados Unidos.

Sim, meus amigos, é incorreto afirmar que o maior público de Jimi tenha sido na fazendo de Woodstock. Dentro de minha própria utopia, gostaria de acreditar que sim, mas em números, sua apresentação como um dos pilares desta edição é superior (pelo menos numericamente) ao seu maior momento sob um palco.

Quando Jimi entrou para a história em Woodstock, às 9 horas da manhã do maior domingo de todos os tempos, o festival que contou com uma das maiores audiência também de todos os tempos, já estava mais vazio. Eram cerca de 25.000 deadheads na plateia, enquanto o público total do Atlanta Pop Festival é estimado entre 300 e 400 mil pagantes.

E pegou um dos grandes momentos da Hendrix Experience como um todo, afinal de contas, na época deste registro, a banda estava numa tour intensiva que já estava em progresso há mais de 2 meses e meio. Por isso ouvimos jams tão azeitadas, refinadas e notamos um cherokee ainda mais ousado e interestelar.

Até a química com seu seguidores era algo que o cidadão explorava de maneira peculiar. Quando uma faixa se encerra nesse LP duplo, parece que ele retorna ao antro terrestre. Durante o solo ele estava em todos os lugares, mas quando se fazia silêncio, a música mais difícil de todas, o Moisés de Seattle até falava – Hey There, baby.

Jimi Hendrix with Electric Ladyland LP

Além de ser um marco, por resgatar um show que virou lenda na mão dos magnatas colecionadores de bootlegs, essa mítica apresentação (que também sairá na forma de DOC num futuro próximo), é também um dos poucos trabalhos póstumos que faz jus ao nome do ser gênesis da guitarra.

Essa gravação é uma das pouquíssimas que não mancha o espólio do membro mais famoso da família Hendrix. É um disco raro (é triste salientar isso), pois não se apoia em outtakes para tentar reciclar um signo da guitarra.

Aqui Jimi pulsa, prova que precisa e se manterá eterno como um imaginário fantasioso que se perpetua como a patriótica versão de ”Spangled Banner”. Num passeio de Macunaíma, o mestre pula para o primeiro disco e nos revela uma rara versão de ”Room Full Of Mirrors”, evidencia uma das mais brilhantes jams para um de seus standards, a bela “Red House” e emula o infinito quando toca “Hear My Train A Coming”.

Viaja sem destino para encontrar sua ”Foxy Lady”, relembra hits Dylanescos com uma ácida versão de ”All Along The Watchtower” e nos reencontra na esquina com a ”Voodoo Child” para tomar uma breja com ”Hey Joe”.

Vamos andar por aí, Jimi, estamos in e off em todos os lugares, pelo menos durante os 85 minutos que o dia 4 de julho de 1970 ressoar em nossos corpos, sempre com Billy Cox no baixo e Mitch Michell no Jazz Experienced.